Horizontina,
onze de abril de 2048.
As noticias sobre o
retorno da eletricidade tomaram conta das conversas de todo mundo. As expectativas
aumentaram quando o prefeito convidou o povo para estarem às seis da tarde na
frente da prefeitura para um comunicado urgente.
Enquanto a maioria dos
habitantes da cidade esperava pelo comunicado, o prefeito convocou todos que trabalham
na prefeitura para realizar algumas tarefas que ninguém realizava a cidade. Os
postes de luz foram enfeitados com fitas de varias cores, os globos brancos que
cobriam o topo dos postes foram reparados e limpos. Pisca-piscas foram colocados
na fachada da prefeitura e equipamento de som e vídeo foram instalados ao redor
de um palco montado provisoriamente.
Do hotel, mesas e cadeiras saiam e eram colocados
na rua que separava a praça da prefeitura, alguns lanches eram preparados na
cozinha supervisionada por JH. Tudo deveria estar perfeito. Eram cinco horas e
o povo já havia começado a chegar. O padre Juarez foi o primeiro a chegar, com sua bíblia
e um frasco com água benta começou a benzer o palco. No palco, além de um
microfone, havia site cadeiras e uma mesa com um dispositivo com um botão.
As sete cadeiras estavam
reservadas para o prefeito e os seus seis conselheiros. O conselho da cidade era
formado pelo prefeito e para cidadãos que eram eleitos para o cargo todos os anos.
Com missão de supervisionar as atividades dos trabalhadores da cidade e dos
próprios conselheiros, o conselho servia também como tribunal para pequenas causas
e para missões de confiança do prefeito.
Eram seis horas, todos os
146 habitantes de Horizontina estavam presentes na praça, sentados nas cadeiras
disponíveis, nos arredores dos bancos da praça e alguns montados em seus cavalos.
Uma delegação de Três de Maio e Doutor Mauricio Cardoso foram recebidos com
honras pelo prefeito e foram acomodados em bancos localizados do lado do grande
palco.
Nas duas primeiras fileiras
de cadeiras, as pessoas mais velhas da cidade estavam sentadas, esperando o
discurso entre uma rodada e outra de chimarrão. Atrás dos idosos, famílias estavam
juntas depois de um longo dia de trabalho. Adolescentes estavam na praça sentados
entre os bancos. Som de violão vinha desse grupo que animava e esquentava a alma
das pessoas nesse começo de noite outonal
Algumas tochas iluminavam
o palco e os arredores, a fogueira que tradicionalmente era montada em eventos
especiais na praça ainda não havia sido acessa. O povo estava animado, alguns
já imaginavam o que poderia ser dito nessa noite. Murmurinhos haviam se espalhado
da prefeitura e atingido a comunidade que ficou animada com as fofocas. O padre
Juarez que além se seus serviços espirituais era o cronista da cidade, uma
figura de um guardião da sabedoria do povo. Ele estava sentando na terceira
fileira de cadeiras esperando para anotar tudo o que fosse dito nessa noite.
O prefeito subiu no palco,
todos se calaram. No centro da praça, longe das pessoas, a tradicional fogueira
foi acessa por Beatriz. Próximo da fogueira, lanches eram protegidos por panos
para evitar moscas. O prefeito tomou um gole de água e começou:
-Hoje é o dia meus amigos.
Onze de abril de 2048 ficará na história de nossa comunidade. O dia que superaremos
definitivamente o apocalipse!
Sua voz ecoava entre as
caixas de som, sua voz no microfone mostrava confiança e segurança. Antes de
conseguir prosseguir a fala, a multidão gritava e batia palmas insanamente.
Humberto levantou as
mãos pedindo para que o povo ficasse quieto novamente. Quando todos ficaram
silenciosos, o prefeito continuou:
- Temos não um, mas
dois comunicados importantes para esta noite. Todos os que trabalham comigo na
nossa prefeitura sabe o quanto eu pedi para que não espalhasse as novidades,
pois queria comunicar a todos nessa noite, mas vejo que nem todos se seguraram (...). -
Risos se espalharam
entre os conselheiros e a multidão.
-Bem sabiam os
conselheiros da importância desses dois comunicados, e embora estes fossem confirmados
somente no dia de hoje, acreditávamos que não poderíamos esperar-.
-Todos nós sobreviventes,
que resistimos ao isolamento dos bunkers, as migrações de comunidades inteiras
que fugiam das adversidades, estamos aqui vivos, para vislumbramos um novo amanhã! (...). -
Enquanto continuava o
discurso, sua voz ficou mais forte. Seus pulmões e sua garganta eram forçados
conforme cada nova frase que Humberto dizia. O povo olhava para ele com sinal
de aprovação e emoção. A lua brilhava nessa noite fria sem nuvens.
- O nosso futuro não só
como a comunidade de Horizontina, mas como uma verdadeira nação. Todos nós
perdemos alguém naqueles dias sombrios, de fome, de frio, de guerra, da morte!
- Hoje amigos, entramos
em contado, com tropas do exercito do Estado (...). -
Começaram os murmúrios entre todos, alguns assustados
e outros confusos. Até a delegação das duas cidades ficaram confusas e espantadas
com tais notícias. Enquanto a conversas sumiam, o prefeito tossiu e continuou:
- Todos sabem como foi traumático o apocalipse. Foram
momentos terríveis de dor e sofrimento, mas devemos nos lembrar de no fim de
tudo que a nossa união e a nossa perseverança é que garantiu a nossa sobrevivência.
-
- Na próxima semana, esse grupo que representa o
governador Arthur Biancchinni, irá nos visitar em breve. Peço que todos os
recebam bem, esses visitantes é o mais próximo de um governo de alcance estadual
que temos. O Governo Provisório Gaúcho esta sediado em Piratini e tem em seus amigos
quase metade do nosso antigo Estado. Brasília caiu, Porto Alegre também, MAS
PIRATINI SOBREVIVEU!-
Enquanto mais uma rodada de palmas agitava o pessoal,
o prefeito esperou todos se acalmarem. Quando tudo ficou silencioso, ele continuou:
- É HOJE! É O MOMENTO!
O povo estava em transe.
Todos esperavam o próximo passo do prefeito. Tomando mais um pouco de água,
Humberto apertou o botão que estava na mesa ao seu lado no palco.
Os fios que saiam desse
botão percorriam o chão em direção da prefeitura. O som de alguns rangidos e
estalos foi substituído pelas luzes que se acederam primeiramente por toda a
prefeitura, percorreu pelos piscas-piscas que cobria a fachada da prefeitura. O
povo estava assustado e entusiasmado. Os postes da praça acenderam, os prédios
de dentro da cidade fortificada e alguns próximos da muralha estavam todos acessos.
A igreja, o hotel, as residências e demais construções ficaram cobertas de luz
e de sons que a muito tempo não se ouviam.
Antigos telões de led das
antigas lojas quem funcionavam no centro, voltaram a funcionar. Marcas que não
existiam mais, números de telefones que não existiam mais e foto de modelos que
poderiam não estar mais vivos aparecem nos telões. As letras neon de um antigo
bar acederam. “24 Horas” dizia.
Todos olhavam em todas as direções que surgiam
pontos de luzes ou algum som diferente. Da sacada do segundo andar da prefeitura,
Carlos comandava a ligação e o controle da luz de seu painel. Algumas pessoas das
delegações e do conselho começaram a fotografar o momento. Gravar em imagens e
sons essa ocasião para a posterioridade.
O momento quando tudo acendeu
seria descrito pelo padre Juarez nas suas anotações como “Um momento de alegria
inconcebível para quem não estava presente. Os olhos lacrimejantes e saudosos
dos velhos tempos que vinham dos adultos e o olhar de curiosidade e espanto das
crianças e dos jovens que nunca viram ou pouco viram a luz, é uma memória que
me sinto obrigado a admirar e me emocionar.”.
-Uma salva de palmas pessoal
para todos nós. Em especial para o Carlos, Guilherme, Letícia e Dionísio que
repararam todas as fiações, mexeram em cada painel de controle, e garantiram o
funcionamento de tudo para hoje!- Os conselheiros se cumprimentaram e desceram
o palco para saudar o grupo.
Entre muitas palmas e
gritos, alguns montados a cavalo deram alguns tiros para cima em sinal de
comemoração. Todos estavam animados e emocionados com tudo e todos. Carlos
cumprimentava o pessoal de longe, enquanto acionava um botão do painel e duas
levas de fogos de artifício subiam o ar com seu barulho e terminando numa bela
explosão de cores e formas.
- CONVIDO TODO A
COMPARECER PERTO DA FOGUEIRA PARA CELEBRARMOS!-
Do telão que havia sido
instalado perto do palco, imagens começaram a aparecer, enquanto da caixa de
som, uma agradável musica instrumental tocava. As imagens eram das pessoas da
comunidade em seus postos de trabalho, de crianças brincando nas ruas, das
celebrações que já haviam sido celebradas anteriormente, paisagens locais e
fotos de antigos moradores e da cidade de antes de tudo o que aconteceu.
Alguns dançavam lentamente a musica, outros admiravam espantados por todo aquele clarão de luzes que se espalharam por todos os lugares. Próximo da mesas com a comida, todos se cumprimentavam e se abraçavam.