quinta-feira, 30 de abril de 2015

Capítulo 3: Dez anos de guerra -Parte 1-

O mundo havia mudado muito nesses dez anos. 
O mundo em 2038 tinha uma população de quase nove bilhões de pessoas, sendo destas, 65% viviam em centros urbanos. No primeiro mês de caos, mais de quatro bilhões de pessoas morreram em decorrência das explosões nucleares, pela radiação e pela fome. 

Enquanto o mundo se silenciava, sobreviventes fugiam de centros urbanos que se encontravam em ruínas e se deparavam com todo o tipo de situações.

Alguns diriam que os que morreram instantaneamente pelas bombas tiveram sorte. A temperatura global despencou, plantações foram arruinadas por pestes e pelo clima. Se um observador qualquer pudesse ver de fora o nosso planeta, provavelmente lhe faltariam palavras para descrever tudo o que viu e sentiu.

O planeta azul havia mudado.......       
                                                         
Em quase uma dezena de milhar de anos, o Estreito de Berenger que separara os Estados Unidos da Rússia, não existia mais. Uma única e disforme massa de gelo cobria o pacífico norte em grandes extensões. No atlântico norte a situação era a mesma, a Islândia e a Groenlândia estavam igualmente cobertas de gelo.

No norte da Europa e Ásia o gelo que existiam avançou e cobre grandes extensões dos mares do norte. No sul do continente americano, partes da Argentina e do Chile estavam cobertas de gelo, a antártica que durante décadas do século XX e XXI perdera grandes extensões da calota polar, estas avançavam novamente em todas as direções.

Se o nosso observador fosse atento, ele diria que o mundo havia entrado numa nova era glacial.

Se agora os oceanos parecem calmos, a situação não seria a mesma a seis anos atrás. Enquanto as temperaturas médias dos continentes e dos oceanos não se igualavam, enormes ciclones varreram os litorais do mundo tempo, aumentando ainda mais os estragos.

A perda de vidas humanas e de espécimes animais e vegetais é incalculável para o nosso observador visto dessa distancia, mas se ele se aproximasse mais, veria os estragos. Extensas regiões em processo de desertificação. Alguns lugares se tornavam desertos infernais e outros em infernos congelados.

Lugares que foram poupados diretamente da explosão ou da radiação tiveram sorte no primeiro momento e foram preenchidos por refugiados. Mesmo com a destruição, ainda havia guerra. Governos caíram, países foram riscados do mapa, a população sofreu fome, violência e morte.

Nesses dez anos, dois bilhões de seres humanos ainda resistiam num ambiente hostil.

Nosso observador voltando para o espaço, veria as quatro estações espaciais que continuam flutuando ao redor da Terra, piscando suas luzes automáticas em vão. Na lua, as luzes continuam, embora os sinais de rádios já tivessem cessado a mais de três anos.


Se olhar de mais longe, nenhuma raça alienígena ou um deus veio nos salvar. Os humanos estavam órfãos. Enquanto o Sistema Solar continuava cruzando o universo na sua dança habitual, ninguém até agora sentira a nossa falta.

( -> Capítulo 3: Dez anos de guerra - Parte 2)



quarta-feira, 22 de abril de 2015

Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse -Parte Três-

Horizontina, dezoito de fevereiro de 2038.

Os primeiros dias foram de buscar suprimentos nas casas próximas. JH havia criado algumas regras para sua família, no qual explicava o que deveria procurar e como agir diante de contato com outras pessoas.

Num quadro de giz estava escritos as quatro principais regras:
-Saia sempre acompanhado;
-Leve um apito, lanterna e o contador geiger;
-Não fique muito tempo na rua ou numa casa;
-Se na casa escolhida tiver pessoas, não leve nada.

As casas mais próximas estavam vazias. Os carros haviam sumido das garagens. JH havia escolhido sua filha para ir à primeira busca com ele. Beatriz ficara muito abatida e estressada naquele tempo presa dentro um cubículo praticamente sem privacidade. Agora seria uma boa hora para JH levar sua filha para fora da zona de conforto que ele mesmo havia criado.

A primeira casa que foram vasculhar era uma residência de dois pisos, que fica de frente para sua casa. De uma janela, Fernando observava esperando qualquer pedido de ajuda. Fernando se lembrava do tempo que brincava na rua com os dois filhos dos vizinhos que moravam naquela casa. -Estariam mortos nesse momento ou teriam sobrevivido em algum lugar? -Pensou.

Quantos amigos, familiares e pessoas que ele conhecera durante a vida estariam vivos? Quem teria escapado das bombas, sobreviveria com a falta de comida que chegaria? E o primeiro inverno? Essas questões martelavam sua cabeça. Ele fechou os olhos e disse para si mesmo: Quando eu abrir os olhos, estarei na minha cama. Tudo foi um pesadelo terrível. Abriu os olhos e continuava vendo sua irmã na casa a frente.

Enquanto Fernando divagava, Amélia chegou e abraçou o filho. Era a primeira vez em anos que sua mãe tinha o visto chorar. Mães compreendem os filhos mesmo sem eles abrirem a boca. A dor de Fernando iria passar, ele só precisava de tempo.

Amélia virou o rosto do filho em sua direção, beijou a sua testa e disse: - Mamãe ama você, esta bem?-

Na casa dos vizinhos, parecia que tinha ocorrido um furacão. Objetos caídos, folhas mortas e muitos insetos invadiram o local. O cheiro de umidade inundava o ambiente. Parece que os vizinhos saíram às pressas de casa, a sala espaçosa com dois sofás, lareira e quadros se encontravam vazia. JH chegou perto de uma coleção de quadros que ficava em cima da lareira, mesmo com a poeira ele conhecia aqueles quadros.

As fotos dos dois filhos do casal em diferentes idades preenchiam aqueles quadros. JH se lembrava do tempo que vinha aqui com sua esposa jogar canastra com Henrique e Bruna todas as quintas feiras. Embora não fosse um jogador nato, ele e Amélia se saiam bem contra o casal vizinho. Nesses dias alegres a rua era cheia de som de crianças brincando com bola ou somente correndo uma atrás da outra. Tempos que não vão voltar, pensou JH.

Na sala havia uma mala que tinha sido deixada para trás, provavelmente na pressa esqueceram-se de levar junto. Beatriz vasculhou a mala em busca de algo necessário, buscou em vão. Na mala só havia algumas roupas e alguns quadros antigos.

Tirando o tapete, a televisão presa na parede e a sujeira, não tinha mais nada de interesse na sala. Depois da sala havia um corredor com três portas e no fim uma escadaria que levava para o segundo andar. João e Beatriz entraram no corredor semi-iluminado que novamente se encontrava cheio de quadros e pôster de diversos tipos.

-Beatriz, olhe os cômodos daqui de baixo que eu olho os quartos.-

Antes de ela dizer algo, seu pai já havia subido as escadas.
Beatriz olhou para a primeira porta que ficava do lado esquerdo, lembrava que ali ficava o banheiro. Entrou no banheiro social e não encontrou nada de útil além de uma embalagem de band-aid. Enquanto Beatriz saiu do banheiro ouviu um barulho estranho vindo de cima.

-Pai?- Gritou Beatriz. Sem resposta, resolveu ir até a cozinha procurar alguma coisa que pudesse servir como arma. Procurando entre as gavetas achou uma faca de cortar carne que seria útil caso precisasse usar. Segurando a faca , decidiu subir as escadas.

Subiu lentamente as escadas, desviando das teias e de qualquer objeto que pudesse fazer algum barulho. No segundo andar, o silencio era total. O único barulho era o vento que batia com força na casa. Andou mais alguns passos. O silencio era total.

-Pai?- Falou baixinho.

Sons de passos vinham em sua direção. Uma pessoa, que ela conhecera há muito tempo atras parecia diferente, doente. Era Pedro, um dos filhos do casal donos da casa.

-Pedro? O que houve com você?- Abaixou a faca, esperando uma resposta.
Antes de conseguir uma resposta, Pedro corria em sua direção.

-SAIA DA MINHA CASA!-

Beatriz conseguiu se desviar da primeira investida de Pedro, que continuava gritando coisas indecifráveis. O corpo de Pedro estava pálido e cheio de bolhas. Seus olhos antes azuis, estavam negros. Ele estava louco ou doente, ou os dois. Beatriz correu em direção ao quarto onde anteriormente Pedro havia saído. No chão, seu pai estava desmaiado, um fino fio de sangue escorria pela sua cabeça.

Antes de poder fazer alguma coisa, ela foi empurrada para o lado e chocou-se com uma escrivaninha que ficava ao lado da cama. A faca que carregava na mão esquerda foi jogada para longe. Pedro e Beatriz olharam para a faca. Pedro correu para pegar a faca, mas Beatriz mesmo atordoada chegou antes.

Pedro salta em direção de Beatriz. Erro fatal de Pedro, os gritos e os movimentos cessaram. A faca havia acertado o coração. O silencio voltou novamente. Beatriz ainda estava por baixo segurando a faca que separava ela da pessoa que havia matado.

-Ele... estava doente- Disse João ainda atordoado, pela pancada que havia levado na cabeça. Beatriz ajudou seu pai a levantar, apoiando-se João disse:

-Vamos para casa filha-


Em algum lugar do Litoral do Estado do Rio Grande do Sul:

Horizontina, dezenove de fevereiro de 2038.

Era mais um dia anormal daquele inferno que começara a um pouco mais de um mês. Um reduzido regimento do exército brasileiro que estava realizando exercícios próximos do litoral estavam procurando algum pelotão, quartel ou autoridade que pudessem lhe informar algo.

Fazia uma semana que encontraram uma pessoa que havia dito que todos estavam descendo o Estado, e que o governo havia sido transferido para uma cidade pequena na região. Enquanto o regimento descia o Estado, um rastro de fumaça se formava no céu gaúcho. O objeto passou voando e aterrizou uns 50 metros da linha da praia.


Um compartimento abria daquele objeto. De la saiu um homem gritando algo em russo.

( -> Capítulo 3: Dez anos de guerra -Parte 1 )


terça-feira, 14 de abril de 2015

Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse -Parte Dois-

Horizontina, nove de fevereiro de 2038.

Amanhã, já faria um mês desde que o bunker virou a prisão, ou melhor, o lar da família Costta. O tempo custou para passar nesse ambiente. O tempo era baseado em fazer listas do que se precisava procurar quando todos saíssem daqui.  Embora JH tenha pensando em quase tudo para a sobrevivência da família, eles não sobreviveriam muito tempo mais do que um mês sem renovar os seus suprimentos.

A alimentação embora, não fosse de toda ruim, enjoava fácil. Quase tudo em pó e em quantidade estabelecida por JH, para que a comida durasse um pouco mais de um mês. As atividades dentro do pequeno lar, além de fazer listas e se alimentarem eram os jogos de tabuleiro e cartas. Descobriram logo que no baralho faltavam cartas, para a frustração geral.

Beatriz dedicou nesse quase um mês a verificar a temperatura exterior e as imagens na câmera exterior. Fazia cerca de dez dias que a temperatura havia se estabilizado em 10ºC, uma temperatura fora dos padrões para essa época do ano, mas totalmente justificada pelas alterações do clima global. As imagens da câmera mostravam um ambiente escuro e silencioso, visto que grande quantidade de fumaça e fuligem cobria o nosso planeta.

Fernando aprendera a utilizar o Contador Geiger e junto com seu pai elaboraram planos sobre o que deveria ser feito para o dia onze. Faltavam dois dias para abrirem as portas pela primeira vez desde que ela fora fechada há quase um mês. O Primeiro passo era entrarem em sua verdadeira casa e verificarem o grau de radiação que contaminou o ambiente. Devido a casa ter sido totalmente fechada e protegida por JH, outra preocupação que foi vista por seus filhos como ansiedade antes disso tudo acontecer, esperavam que ela estivesse pouco contaminada.

Amélia nesse um mês se recuperou bem do choque inicial e estava animando as noites com histórias e canções. Ela esperava voltar para casa logo que abrissem as portas do bunker. Ela aprendeu sozinha a verificar os filtros de ar e a testar a qualidade da água que se retirava do solo. Mesmo sabendo que a sua vida e a de seus filhos não seriam normais mesmo saindo do bunker, falando como mãe falava das suas esperanças sobre o futuro, todos esqueciam um pouco os momentos de dores e desesperanças.


Horizontina, onze de fevereiro de 2038.

O dia era hoje. O momento era agora. A porta era aberta rapidamente, enquanto Fernando e João Henrique saiam do bunker. Antes da saída foi decidido que primeiramente os dois iriam verificar se a casa estava em ordem e se o nível de radiação estava num nível tolerável, para que depois Amélia e Beatriz saíssem também.

Mas antes disso Fernando e JH vestiram roupas de inverno, mascaras cirúrgicas, óculos escuros e protetor solar. Embora o tempo estivesse encoberto, as explosões nucleares danificaram seriamente a camada de ozônio e a radiação solar não perdoaria qualquer descuido.

Com a porta aberta, os dois rapidamente saíram enquanto Beatriz fechava novamente a pesada porta. O vento uivava, e o som das respirações do pai e filho eram os únicos sons distinguível além da ventania. O cenário que JH esperava encontrar era sinais evidentes de contaminação no ar, para ele o Contador Geiger estaria fazendo sons altos e o ponteiro estaria agitado. Para sua surpresa, a radiação no ambiente estava em níveis aceitáveis para as pessoas. João quase esboçou um sorriso, mas as preocupações maiores ainda estavam no futuro próximo. 

O próximo passo seria verificar a residência.
Enquanto uma nova realidade era construída a partir de seus olhos, Fernando olhava para o horizonte. Tudo estava calmo, calmo até demais.


350 km acima da superfície, Estação Espacial da L.E.

Comandante Zukhov observava o planeta de sua cabine. O radio e o canal de chamadas da Agencia Espacial Eurasiana que costumava tocar todos os dias, estava mudo. Nenhuma chamada para verificar um componente da estação ou para fazer um experimento. Os que talvez sobreviveram em solo deveriam ter se esquecido dos que ficaram acima da superfície.

Da Lua, uma ou outra chamada Zukhov interceptava e as notícias não eram nada boas. Por uma das chamadas soube que a base lunar da Comunidade Sul-Americana havia sido destruída a cerca de duas semanas. Tumultos generalizados ocorreram nas demais bases, e a estação lunar dos Estados Unidos encontrava-se sob lei marcial.

Zukhov estivera tentando contatar qualquer agência espacial para pedir conselhos e informações, mas tudo estava quieto. O planeta estava quase todo coberto por nuvens negras, quase nenhum contato visual dos continentes.

-Moscou, Paris, Washington e Pequim em silencio. Nenhum sinal de qualquer tipo que nossas antenas pudessem captar da Terra. Estamos sozinhos, devemos tomar as nossas próprias decisões...-

Na Estação da Liga Eurasiana, além de Zukhov, havia mais quatro pessoas. Como de costume nos cosmonautas da Liga, toda nova equipe que viria substituir a anterior era composta em cinco, sendo sempre uma russa e as demais sorteadas entre os 11 países membros.
Nesse um mês em isolamento, dois cosmonautas, o polonês e o georgiano cometeram suicídio, sobrando além de Zukhov, um ucraniano e o lituano. As coisas não iam bem na estação, a ração dos cosmonautas estava chegando ao fim e o contato com a base lunar eurasiana estava suspenso por falhas técnicas.

Tudo estava indo como Zukhov infelizmente previra se não conseguissem contato algum na Terra ou com a base eurasiana, teria de tentar sair da estação. O problema era como sair e sobreviver sem nenhuma ajuda vinda de baixo.

Olhando novamente para a janela, cantava baixinho uma antiga musica de sua terra natal.

Skvoz' grozy siyalo nam solntse svobody,
I Lenin veliky nam put' ozaril,
Na pravoye delo on podnyal narody,
Na trud i na podvigi nas vdokhnovil!

Esta terra nesse momento deveria estar silenciosa. Sempre quis ser cosmonauta, ver o mundo daqui de cima, mas agora preferia não ter sido chamado para a missão. Tinha uma alternativa remota e ousada de sobrevivência, mas essa implicaria em abandonar seus companheiros de base e deixa-los morrerem esquecidos por Deus e do mundo.

( -> Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse -Parte Três)

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse -Parte Um-

Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse


Horizontina, dez de janeiro de 2038.

Uma das teorias da conspiração que JH acreditou durante seus anos, finalmente se cumpriu. Ele estaria feliz e dizendo para o vizinho resmungão da casa ao lado ou aos seus amigos de bocha um “Eu avisei”, mas ele tem coisas mais importantes para se importar agora.
Toda a família acabou por descobrir o que João Henrique tinha feito naquele último mês que ele saiu de férias e sumiu. Num cômodo da casa que somente era usado como depósito ele construiu um pequeno bunker. Tirando o fato de ser pequeno, era totalmente funcional.

Não era um bunker tradicional daqueles que existiam para gente do governo ou para os ricos, era um cômodo de mais ou menos 14m² fortificado e adaptado com três espaços: um dormitório com quatro camas improvisadas, um banheiro e uma área multiuso com cozinha, livros, equipamentos básicos de sobrevivência e jogos de tabuleiro. Não seria um abrigo permanente, mas serviria para sobreviverem pelo primeiro mês, sem precisar sair para nada.
Enquanto toda a família pegavam algumas roupas outros itens de dentro de casa, João Henrique dizia ironicamente:

-Enquanto vocês brincavam de viver suas vidas normais, seu velho pai aqui construiu dutos para circular o ar, furava o chão em busca de água e estocava comida. Lembrem-se do dia que um viciado em teorias da conspiração salvou a vida de vocês.-

Ele terminava essa fala com sua habitual gargalhada irônica.

Pela janela do quarto de seus pais, Fernando pode visualizar o pânico generalizado nas ruas da pequena Horizontina. A maioria das pessoas não acreditavam que isso aconteceria e os que acreditavam, nunca achariam que Santa Rosa, uma cidade com menos de cem mil habitantes e com pouca relevância fosse alvo.

Logo depois de fechar a casa, todos entraram rapidamente no bunker. Quando JH fechou a grande porta de concreto, todo o exterior ficou silencioso. Estavam todos a sós e sem contato com o mundo exterior. O mundo estaria totalmente morto para ele durante o próximo mês.
Amélia estava ainda em choque, sua cabeça não havia processado ainda tudo o que ocorreu nesses últimos minutos. Beatriz estava sentada no chão, com as pernas cruzadas olhando para a parede branca a sua frente. Se antes estivera chorando, agora estava pensando em como seu futuro seria sem as pessoas que convivera durante toda a infância e juventude.

- Amélia, meu amor, queres deitar um pouco? -

JH embora quase nunca dissesse um “eu te amo” para sua esposa, as suas atitudes com ela expressavam esse sentimento muito claramente. Depois de levar Amélia para o quarto, JH se sentou no chão próximo de Beatriz e de Fernando, ele respirou profundamente e começou a pensar em como explicaria para os filhos, como o fim havia chegado.

-Sabem meus filhos, a história é bem curta, e diferente do nosso historiador que adora alongar as histórias com todo o tipo de fato de maior ou menor importância, irei ser sucinto.-

Seu pai e seu irmão perceberam como Beatriz soltou algumas risadas. Eram poucas, mas sinceras.

-Seu velho pai aqui conheceu os computadores mais ou menos com a idade de vocês. Eles eram brancos, muito pesados e muito velhos. Desde o começo do seu uso conheci pessoas na internet que acreditavam em acobertamentos do governo sobre casos de extraterrestres e em previsões apocalípticas de todo o tipo. Numa noite depois que coloquei vocês para dormirem fui olhar os meus sites favoritos do tema e apareceu um texto com o nome: “O Fim do Mundo será atômico”. -

-Isso já faz dez anos...-

Enquanto esperávamos pela continuação da história, papai olhava para o nada e se perdia em seu pensamento. O gerador lhe despertou do transe e foi verificar que ele funcionava em plena capacidade. Ele nos serviria muito bem nesse um mês.

-Quer saber filhos? Estou cansando e amanha continuo a história. Tentem descansar. Amo vocês.-

Horizontina, onze de janeiro de 2038.

Embora o dia anterior tenha sido péssimo, todos conseguiram dormir relativamente bem em seu novo lar. Ao levantarem, Fernando observou JH indo diretamente ver numa pequena tela embutida na parede que funcionava como um sistema de monitoramento verificar se teve algum movimento nas últimas horas.

Beatriz viu pela tela pequenos flocos caindo suavemente. Com muita alegria ela falou:

-É neve! Está nevando, em pleno verão! -

-Não é neve não irmã. Não é algo natural...-

João Henrique que segurava uma xícara com café deu um sorriso largo e explicou:

- Isso como seu irmão disse Beatriz, não é bem uma neve. Esse fenômeno vem da fuligem decorrente da explosão nuclear. Imagine filha, que tudo na região da explosão, foi vaporizado e queimado. Toda essa fuligem volta para o solo em varias formas, uma dessas formas é essa neve preta. Entendem?-

-A nossa sorte é que na hora da explosão, o vento soprava para o leste. O pior por hora não nos atingiu.-

-Como eu dizia na noite passada, um usuário contava uma fantástica história de um grupo internacional que tinha planos para levar o colapso da civilização, visto que a humanidade já havia conquistado uma independência de velhas ideias como a fé, a ignorância, o medo. Segundo o usuário, a humanidade para se curar de sua total soberba, independência e vaidade, precisava ser testado, ser levada ao limite entre a sobrevivência e o colapso.-

-Como a divisão do átomo nos levou a uma nova revolução no nosso planeta e nos levou para fora dele, pela divisão do átomo deveria ser nosso fim. É uma história muito longa, mas resumindo para vocês filhos, quando uma cidade fosse destruída para mostrar ao mundo que os boatos que existiam sobre o grupo eram reais. A semente do medo seria instalada em toda a humanidade.-

-E vocês sabem que Miami não foi escolhida aleatoriamente. Sabem por qual motivo Miami foi escolhida?-

Diante do silencio de Amélia, Fernando e Beatriz, JH continuou:

-Miami era a capital mundial das maiores indústrias aeroespaciais e da Agência Internacional de Controle Nuclear.-

-Com o medo instalado em toda a humanidade os cavaleiros do apocalipse poderiam fazer a colheita da humanidade. A maioria iria morrer nos primeiros anos, e quem sobreviveria estaria sujeito ao domínio dessa organização que segundo o usuário no fórum, já estariam infiltrados, nos governos, nos exércitos e nas lideranças espirituais.-

-Mas pai, eu fiquei com uma dúvida.-

-Diga filho.-

-Se os quatros cavaleiros, que são a morte, a peste, a guerra e a fome são uma analogia aos efeitos das bombas e das ações da humanidade, como essa organização controlaria todo o processo?-

Para a surpresa de todos, JH não sabia responder.
Essa história embora muito fantástica e inacreditável ainda para os olhos dos seus filhos e da sua esposa, JH percebia que se existisse um plano global de implantar o medo na humanidade, ele foi um sucesso. Sabia que nesse momento, ele deveria se tornar uma espécie de líder e mentor da sua família. Eles não esperavam que suas vidas mudassem radicalmente em questão de dias.
Enquanto todos ficavam dentro do bunker, JH tentava pensar no momento, e nesse momento ele estava faminto.

-Hoje é meu dia de preparar a comida. Quem quer uma deliciosa refeição desidratada e de acompanhamento, algumas balinhas de sobremesa? -

A risada de JH continuava a mesma, nos momentos bons ou nos ruins.

( -> Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse -Parte Dois)

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Capítulo 1: Dez Minutos -Parte Dois-

350 km acima da superfície, Estação Espacial da L.E.

Se no espaço o som fosse propagado, nesse momento o planeta Terra estaria em silêncio. As grandes e pequenas cidades estavam paradas, todos estavam esperando o fim inevitável. Contudo alguns ainda acreditavam que tudo aquilo seria a maior brincadeira na história da raça humana, e que nada aconteceria. Tudo teria sido a pior brincadeira de mal gosto.
Para aqueles que acreditavam no fim, o colapso da civilização parecia eminente nesses últimos momentos. Do espaço, as quatro estações espaciais em órbita seguiam em silencio, os astronautas que estavam nela certamente preferiam estar em seus lares junto com o seus familiares, observando no horizonte a sua morte chegando, mas alguns pareciam mais determinados.
Comandante Zukhov, era o chefe da Estação Espacial da Liga Eurasiana, um consórcio de 13 países que haviam construído sua própria estação de pesquisa na órbita da Terra, como ponto de carregamento para viagens às bases lunares existentes.

-É uma pena, meus camaradas que a humanidade conseguiu fazer o que nem na época da Guerra Fria foi possível. Hoje veremos a extinção da humanidade ou o seu novo renascimento. As bases lunares entrarão em anarquia, mas eu espero com todas as minhas esperanças que o entendimento entre elas chegará e ao menos parte da raça humana poderá sobreviver. Não será fácil, mas como as coisas estão indo por lá, a união os permitirão resistir (...)-

Enquanto Zukhov terminava seu discurso, a Estação Espacial da Liga Eurasiana sobrevoava a Europa. Em grande parte do continente já era noite e as luzes das cidades cobriam grandes extensões do continente.  O marcador do horário de Greenwich chegou às 19 horas. Como a OIPNOM havia prometido, inúmeros flashes de luzes surgiram.
De Londres as explosões se espalharam ao mesmo tempo pelo globo, em segundos os sistemas elétricos de toda a Europa falharam. O continente europeu que provavelmente era o mais iluminado de todos, berço da cultura ocidental e palco de algumas das maiores civilizações que já existiram, estava às escuras.
Pequenos pontos de luzes ainda existiam, mas era questão de tempo até que o sistema entrasse em colapso e caísse junto. O mundo deveria estar igual à Europa agora. O fim para grande parte da civilização finalmente tinha acontecido.

-Adeus planeta Terra, eu espero que você um dia seja novamente o lar de uma espécie humana mais forte e unida, e que ao menos tenha aprendido com os nossos erros do passado. -

Horizontina, 10 de janeiro de 2038.

10, 9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1 e 0.

Eram 19 horas no horário de Greenwich, 17 horas horário oficial de Brasília.
A contagem havia se encerrado. As luzes ainda estavam acessas, e o barulho de eletrodomésticos e de produtos eletrônicos ainda continuava no ar. Seria um blefe enorme essa história de apocalipse?
Enquanto Amélia começava a esboçar um sorriso, um barulho ensurdecedor tomou conta da região. A televisão saiu do ar, logo depois a energia elétrica entrou em colapso. Todos correram para fora de casa e presenciaram de longe a morte.
No horizonte, a cidade de Santa Rosa fora atingida. O resto do cogumelo atômico continuava a ser uma presença macabra na paisagem. Centenas de pessoas visualizavam de longe essa cena, muitos pensavam nos seus parentes e amigos que poderiam ter perecido, e outros pensavam no futuro negro que tinham pela frente.

O futuro que era incerto momentos antes disso acontecer, desmoronou rapidamente. Nas cidades e nos campos, multidões se desesperaram. Enquanto os últimos traços de civilização desmoronam em questões de dias, os membros do grupo que armou tudo isso saia lentamente de seus esconderijos e vislumbravam admirados todo o caos que criaram. Estava na hora da OIPNOM agir.