Horizontina,
vinte de abril de 2048
O dia anterior foi realmente
exaustivo para todos envolvidos na recepção da comitiva. Ontem fora um dia realmente
agitado. Enquanto o prefeito da cidade e o embaixador conversavam entre sim,
construindo novos alicerces para a amizade e cooperação, os militares que vieram
com a comitiva, montaram uma grande tenda que cobriu parte da rua que separava a
prefeitura da praça.
Dentro dessa tenda, a carroça teve parte de sua carga
desmontada. Aos poucos o local virou um posto provisório, onde os militares de
Piratini estavam esperando ordens do embaixador ou da própria capital, através
de uma estação de radio ligado exclusivamente para a sede.
A reunião entre os
representantes durou cerca de 5 horas. Era depois das dezessete horas que Fernando
e a soldada Maria terminassem de redigir uma ata da reunião que seria impressa,
assinada pelo prefeito e pelo embaixador e uma cópia que seria colocada no mural
de avisos e decretos que estava localizado no hall de entrada da prefeitura.
Antes da assinatura do
prefeito, o restante dos membros dos conselheiros foram chamados para lerem as
propostas elaboradas. Sem grandes modificações, o documento foi aprovado e assinado.
Entre os pontos principais
estabelecidos, estavam:
- O município de
Horizontina, aceita a adesão como parte efetiva dentro das terras do Governo
Provisório Gaúcho, tendo seus direitos de autonomia local garantidas sem grandes
restrições;
- Recuperação do aeroporto
municipal para recebimento de monocópteros, aviões de pequeno porte e zepelins
militares;
- Restabelecimento das
linhas de transmissão de energia com Três de Maio e Doutor Maurício Cardoso,
sendo que Horizontina e Três de Maio deveria ampliar sua capacidade de geração
de energia;
- O município de Três
de Maio e juntamente com Horizontina deveria achar um local adequado e construírem
um acampamento avançado para cerca de 50 soldados que viriam diretamente de Piratini.
O local deveria ser a meio caminho dos dois municípios.
Depois do aceite do
prefeito e da assinatura do documento, todos os representantes da administração
da cidade e membros do conselho se reuniram com os soldados na tenda, onde alguns
equipamentos eram tirando de caixas. Eram drones de reconhecimento, usados para
reconhecimento de terreno e coleta de fotos de alta qualidade. Enquanto os três
drones voavam calmamente para fora da tenda, um dos militares que o ativou
disse:
- Os drones irão fazer
fotografias aéreas de todo o perímetro urbano e das áreas adjacentes, como
relevo, rede hidrográfica e vegetação. Vamos atualizar as imagens que temos de
todas as áreas possíveis do Estado. O último levantamento foi em setembro de
2037, e como sabemos tudo mudou desde lá.
Enquanto alguns acompanhavam
as imagens que os drones capturavam e era exibida nas telas dos computadores.
Muitas áreas mais periféricas da cidade haviam sido engolidas pela vegetação.
Um pequeno grupo de soldados se retirou da tenda juntamente com Carlos que iria
mostrar a sala de radio, e onde poderia ser instalada uma antena mais potente para
manter contato diretamente e constante com Piratini.
Enquanto a noite descia,
foi celebrada uma festa de boas vindas aos militares que foi realizada no restaurante
do hotel. Depois que todos se retiraram para mais uma noite de sono, a cidade
voltou ao normal, mas por pouco tempo. O sol nem havia nascido quando os soldados
desmontaram a tenda, tiraram seus cavalos dos estábulos e partiram rumo a
procura de cidades e povoados situados próximos ao rio Uruguai.
Naquela segunda feira tanto
Fernando quanto Paloma ficaram em casa, curtindo um dia de folga antes de começarem
a ajudar nas fazendas ao redor da cidade. Havia grande expectativa sobre uma
possível colheita recorde de trigo. Paloma havia colhido algumas flores que nasceram
próximos aos portões de Horizontina e colocara em uma vasilha com água para
decorar a mesa de jantas.
Mesmo com hábitos tão
diferentes, Paloma e Fernando eram um casal que se completava de modos
diferentes. Fernando muitas vezes se perdia em seus pensamentos desde a morte
de sua mãe, às vezes chegava a sumir um ou dois dias até retornar para casa
como se não tivesse desaparecido. Já havia tentando seguir seu marido, não
desconfiava da fidelidade dele, mas queria poder ajuda-lo em seus momentos.
Fernando abriu os olhos
e abriu a cortina da janela. Da visão que a janela lhe proporcionava, poucas
pessoas estavam andando pelas ruas. Avistou longe seu pai caminhando em direção
a um dos portões de saída. Enquanto contemplava o silencio, um canto de algum
pássaro penetrou calmamente em sua mente, alguns canários viviam na arvores que
cercavam a praça.
Caminhando em direção à
cozinha, o cheiro de café coado era um odor que não sentia fazia anos. Ficara
cerca de quatro anos sem sentir o agradável gosto de café, desde que não encontrara
mais o produto pelas casas abandonadas ou trocadas por outra mercadoria, para
sua sorte conseguira de presente do Embaixador um pouco de café.
Disse o Embaixador,
enquanto distribuía café para os conselheiros, que Piratini conseguia café com as
repúblicas localizadas na região do antigo Estado de São Paulo, e que como o
dinheiro em papel perdera grande parte do seu valor, Piratini trocava gado e
produtos de couro por café e outros produtos tropicais.
Enquanto tomava o
primeiro gole de café, uma sensação de alívio surgiu em sua mente. Como quase
todos adultos dos velhos tempos, era viciado em cafeína. Sentiu o gosto do café
em sua boca enquanto cheirava vagarosamente sobre a xícara. Abriu seus olhos e
percebeu que sua esposa estava lá, se divertindo com as expressões faciais de
Fernando.
Fernando suspirou
profundamente.
- Você é feliz Paloma? -
- Díos mio, Fernando.
Claro que sou feliz. Que pergunta boba foi essa? -
- Verdadeiramente? Eu
me sinto tão ausente com meu pai, minha irmã, mas especialmente com você. Tenho
falhado como amigo e companheiro. -
Os olhos de Fernando
estavam cheios d’agua.
- Eu... não sei mais o
que fazer... Sinto que estou em colapso... -
Paloma pega as mãos de
Fernando e as beija.
- Não diga isso querido.
Você tem feito coisas maravilhosas por todos nós. Você foi o meu primeiro amigo
quando cheguei aqui. Lembra como cheguei aqui? Perdida, confusa, com medo. –
- Você tem sido
maravilhosa minha amada. Espero poder ser mais presente com você. –
Paloma deu um sorriso,
enquanto ajeitava o cabelo de Fernando que tapava um pouco seus olhos.
- Respire um ar puro
amor. –
Enquanto levantava da
cadeira, Paloma deu um tapa na bunda de Fernando e disse:
-
Se parece a una chica con todo este sentimento. – Dando uma risadinha e uma
piscadela para Fernando.
Fernando
riu e disse:
-Você
é a rocha da relação amor. –
Em
algum lugar do noroeste do Rio Grande do Sul, vinte de abril de 2048
Entre as ruínas de uma
das inúmeras comunidades rurais abandonadas pelo Rio Grande do Sul, três homens recebiam uma mensagem em código.
Entre escombros de meia
dúzia de casas e um colégio rural, um trailer de formato arredondado chamava a atenção.
Próximo ao trailer, três barracas individuais estavam montadas, formando um
círculo ao redor do trailer.
Na fogueira um pouco
afastada, um coelho estava sendo assado, dois dos três homens estavam próximo da
fogueira, esperando a comida ficar pronta, enquanto o outro traduzia a mensagem
vinda em códigos. Ele não parecia surpreso com a mensagem que vinha. Era um
pouco mais de meia dúzia de palavras que davam sua próxima missão.
Seus olhos ficaram
pesados, poderia ser o sono ou o arrependimento de ter ingressado na OIPNOM e
abandonando sua família, ou uma mistura de ambos. Sua consciência estava
tentando decidir se resolveria ajudar como havia prometido uma vez ou iria contribuir
para construir a Nova Ordem?
Sua mente estava
perdida, uma sucessão de possibilidades agitavam sua mente. Voltou a si com o
chamado de um de seus companheiros:
- E então T, o que diz
a mensagem?
Exitosamente, T
respondeu:
- Companheiros,
Pindorama acordou. Devemos nos aproximar e estudar Três de Maio e Horizontina.
Seus dois companheiros
de missão vibraram com a notícia. Finalmente poderia fazer algo e contribuir
com a causa na qual eles dedicaram anos de vida em uma extensa rede de um submundo
de informantes e sabotadores. A maioria de todos os soldados menores da OIPNOM
foram recrutados logo após os ataques iniciais onde escapar do pânico, da fome
e da possibilidade de morrer foram moedas de troca para obter informações,
recursos e controle se tornando agentes da Nova Ordem.
M pegou uma
submetralhadora e disparou em direção aos céus.
T simplesmente ignorou
o ato e atingiu M com um olhar de desaprovação.
B olhava animadamente
para M. B disse:
- Imagine quando vamos
finalmente fazer grandes sabotagens e matar pessoas?
Aquilo era o ápice da
dúvida que T tinha sobre o
futuro de sua vida. Sem pestanejar pegou entrou no trailer e pegou seu
revolver. Sem M e B perceberem, T disparou uma vez em cada um. Mira perfeita.
Dois tiros bem no meio da testa.
T olhou para os dois
corpos no chão e agora se perguntavam qual seriam os nomes de seus dois antigos
companheiros. Só sabiam as iniciais de seus nomes.
Ele se apressou para
preparar o acampamento para mudar de lugar, os tiros poderiam ter atraído olhares
indesejados nesse momento. Deveria primeiramente enterrar os corpos e partir
desse lugar.
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