Horizontina,
dez de janeiro de 2038.
Uma das teorias da
conspiração que JH acreditou durante seus anos, finalmente se cumpriu. Ele
estaria feliz e dizendo para o vizinho resmungão da casa ao lado ou aos seus
amigos de bocha um “Eu avisei”, mas
ele tem coisas mais importantes para se importar agora.
Toda a família acabou
por descobrir o que João Henrique tinha feito naquele último mês que ele saiu
de férias e sumiu. Num cômodo da casa que somente era usado como depósito ele
construiu um pequeno bunker. Tirando o fato de ser pequeno, era totalmente
funcional.
Não era um bunker
tradicional daqueles que existiam para gente do governo ou para os ricos, era
um cômodo de mais ou menos 14m² fortificado e adaptado com três espaços: um
dormitório com quatro camas improvisadas, um banheiro e uma área multiuso com
cozinha, livros, equipamentos básicos de sobrevivência e jogos de tabuleiro.
Não seria um abrigo permanente, mas serviria para sobreviverem pelo primeiro
mês, sem precisar sair para nada.
Enquanto toda a família
pegavam algumas roupas outros itens de dentro de casa, João Henrique dizia ironicamente:
-Enquanto vocês
brincavam de viver suas vidas normais, seu velho pai aqui construiu dutos para
circular o ar, furava o chão em busca de água e estocava comida. Lembrem-se do
dia que um viciado em teorias da conspiração salvou a vida de vocês.-
Ele terminava essa fala
com sua habitual gargalhada irônica.
Pela janela do quarto de
seus pais, Fernando pode visualizar o pânico generalizado nas ruas da pequena
Horizontina. A maioria das pessoas não acreditavam que isso aconteceria e os
que acreditavam, nunca achariam que Santa Rosa, uma cidade com menos de cem mil
habitantes e com pouca relevância fosse alvo.
Logo depois de fechar a
casa, todos entraram rapidamente no bunker. Quando JH fechou a grande porta de
concreto, todo o exterior ficou silencioso. Estavam todos a sós e sem contato
com o mundo exterior. O mundo estaria totalmente morto para ele durante o
próximo mês.
Amélia estava ainda em
choque, sua cabeça não havia processado ainda tudo o que ocorreu nesses últimos
minutos. Beatriz estava sentada no chão, com as pernas cruzadas olhando para a
parede branca a sua frente. Se antes estivera chorando, agora estava pensando
em como seu futuro seria sem as pessoas que convivera durante toda a infância e
juventude.
- Amélia, meu amor,
queres deitar um pouco? -
JH embora quase nunca dissesse um “eu te amo” para sua
esposa, as suas atitudes com ela expressavam esse sentimento muito claramente.
Depois de levar Amélia para o quarto, JH se sentou no chão próximo de Beatriz e
de Fernando, ele respirou profundamente e começou a pensar em como explicaria
para os filhos, como o fim havia chegado.
-Sabem meus filhos, a
história é bem curta, e diferente do nosso historiador que adora alongar as
histórias com todo o tipo de fato de maior ou menor importância, irei ser
sucinto.-
Seu pai e seu irmão perceberam como Beatriz soltou algumas risadas. Eram poucas, mas sinceras.
-Seu velho pai aqui
conheceu os computadores mais ou menos com a idade de vocês. Eles eram brancos,
muito pesados e muito velhos. Desde o começo do seu uso conheci pessoas na
internet que acreditavam em acobertamentos do governo sobre casos de
extraterrestres e em previsões apocalípticas de todo o tipo. Numa noite depois
que coloquei vocês para dormirem fui olhar os meus sites favoritos do tema e
apareceu um texto com o nome: “O Fim do Mundo será atômico”. -
-Isso já faz dez
anos... -
Enquanto esperávamos
pela continuação da história, papai olhava para o nada e se perdia em seu
pensamento. O gerador lhe despertou do transe e foi verificar que ele funcionava
em plena capacidade. Ele nos serviria muito bem nesse um mês.
-Quer
saber filhos? Estou cansando e amanha continuo a história. Tentem descansar.
Amo vocês.-
Horizontina,
onze de janeiro de 2038.
Embora o dia anterior
tenha sido péssimo, todos conseguiram dormir relativamente bem em seu novo lar.
Ao levantarem, Fernando observou JH indo diretamente ver numa pequena tela
embutida na parede que funcionava como um sistema de monitoramento verificar se
teve algum movimento nas últimas horas.
Beatriz viu pela tela
pequenos flocos caindo suavemente. Com muita alegria ela falou:
-É neve! Está nevando,
em pleno verão! -
-Não é neve não irmã.
Não é algo natural...-
João Henrique que
segurava uma xícara com café deu um sorriso largo e explicou:
- Isso como seu irmão
disse Beatriz, não é bem uma neve. Esse fenômeno vem da fuligem decorrente da explosão
nuclear. Imagine filha, que tudo na região da explosão, foi vaporizado e
queimado. Toda essa fuligem volta para o solo em varias formas, uma dessas
formas é essa neve preta. Entendem?-
-A nossa sorte é que na
hora da explosão, o vento soprava para o leste. O pior por hora não nos
atingiu.-
-Como eu dizia na noite
passada, um usuário contava uma fantástica história de um grupo internacional
que tinha planos para levar o colapso da civilização, visto que a humanidade já
havia conquistado uma independência de velhas ideias como a fé, a ignorância, o
medo. Segundo o usuário, a humanidade para se curar de sua total soberba,
independência e vaidade, precisava ser testado, ser levada ao limite entre a
sobrevivência e o colapso.-
-Como a divisão do
átomo nos levou a uma nova revolução no nosso planeta e nos levou para fora
dele, pela divisão do átomo deveria ser nosso fim. É uma história muito longa,
mas resumindo para vocês filhos, quando uma cidade fosse destruída para mostrar
ao mundo que os boatos que existiam sobre o grupo eram reais. A semente do medo
seria instalada em toda a humanidade.-
-E vocês sabem que
Miami não foi escolhida aleatoriamente. Sabem por qual motivo Miami foi
escolhida?-
Diante do silencio de
Amélia, Fernando e Beatriz, JH continuou:
-Miami era a capital
mundial das maiores indústrias aeroespaciais e da Agência Internacional de
Controle Nuclear.-
-Com o medo instalado
em toda a humanidade os cavaleiros do apocalipse poderiam fazer a colheita da
humanidade. A maioria iria morrer nos primeiros anos, e quem sobreviveria
estaria sujeito ao domínio dessa organização que segundo o usuário no fórum, já
estariam infiltrados, nos governos, nos exércitos e nas lideranças espirituais.-
-Mas pai, eu fiquei com
uma dúvida.-
-Diga filho.-
-Se os quatros
cavaleiros, que são a morte, a peste, a guerra e a fome são uma analogia aos
efeitos das bombas e das ações da humanidade, como essa organização controlaria
todo o processo?-
Para a surpresa de
todos, JH não sabia responder.
Essa história embora muito
fantástica e inacreditável ainda para os olhos dos seus filhos e da sua esposa,
JH percebia que se existisse um plano global de implantar o medo na humanidade,
ele foi um sucesso. Sabia que nesse momento, ele deveria se tornar uma espécie
de líder e mentor da sua família. Eles não esperavam que suas vidas mudassem
radicalmente em questão de dias.
Enquanto todos ficavam
dentro do bunker, JH tentava pensar no momento, e nesse momento ele estava
faminto.
-Hoje é meu dia de
preparar a comida. Quem quer uma deliciosa refeição desidratada e de
acompanhamento, algumas balinhas de sobremesa? -
A
risada de JH continuava a mesma, nos momentos bons ou nos ruins.
( -> Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse -Parte Dois)
( -> Capítulo 2: A década dos Cavaleiros do Apocalipse -Parte Dois)
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